Experiências traumáticas na infância elevam significativamente o risco de doenças mentais na vida adulta

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Cerca de 42% dos adultos australianos — mais de 8 milhões de pessoas — passaram por algum trauma ainda na infância, segundo um estudo liderado pela Universidade de Sydney e publicado no Australian and New Zealand Journal of Psychiatry. A pesquisa mostra que esses indivíduos têm 50% mais risco de desenvolver transtornos mentais ou problemas relacionados ao uso de substâncias ao longo da vida, além de maior probabilidade de sofrer ansiedade, depressão, transtorno do pânico e até tentar suicídio.

Os pesquisadores analisaram dados de 15.893 entrevistados do Estudo Nacional de Saúde Mental e Bem-Estar de 2020 a 2022, conduzido pelo Departamento Australiano de Estatística. Ao todo, foram avaliados 26 tipos de experiências traumáticas, como abuso, negligência, agressão sexual, exposição à violência doméstica, acidentes graves, desastres naturais, doenças, lesões, guerra e morte inesperada de um ente querido. Metade dos registros ocorreu antes dos 10 anos de idade, em alguns casos com crianças de seis anos.

“Alerta nacional”

Para a Dra. Lucy Grummitt, pesquisadora do Centro Matilda de Pesquisa em Saúde Mental e Uso de Substâncias, os números exigem resposta imediata.

“A dimensão e o impacto do trauma infantil na Austrália pedem atenção urgente dos formuladores de políticas, prestadores de serviços e da comunidade”, afirma.

O estudo indica ainda que mulheres relatam traumas infantis com maior frequência. O impacto total pode ser ainda maior, já que pessoas em situação de rua, encarceradas ou de comunidades indígenas isoladas não entraram na amostra.

Efeitos que duram toda a vida

Além da saúde mental, os traumas também aumentam o risco de doenças crônicas na vida adulta, como asma, artrite, câncer e doenças renais.

“O trauma não é apenas um problema da infância, mas um problema de saúde para toda a vida”, diz Grummitt.

Estimativas apontam que traumas não resolvidos geram um custo anual de 9,1 bilhões de dólares aos contribuintes australianos. Para os pesquisadores, o atendimento sensível ao trauma precisa estar presente em toda a rede de assistência — não só na saúde mental, mas também em hospitais, unidades de atenção primária, escolas, justiça e proteção infantil.

Impactos também na escola

Segundo os autores, dois em cada cinco jovens terão vivenciado um trauma até o ensino médio. Esses estudantes têm mais chance de apresentar comportamentos que resultam em suspensão ou expulsão, muitas vezes consequência direta do sofrimento.

“Professores estão na linha de frente e precisam de ferramentas para reconhecer sinais de trauma”, explica Grummitt.

Ela reforça que punições podem agravar o problema ao aumentar sentimentos de vergonha e isolamento:

“As crianças muitas vezes reagem mal porque estão sofrendo. Responder com cuidado pode mudar o rumo da vida de uma criança.”

O que os especialistas pedem

Pesquisadores defendem ações nacionais para:

reconhecer o trauma infantil como um fator de risco central para problemas de saúde física e mental;

garantir treinamento e recursos às escolas para identificação de sinais de trauma;

implementar atendimento informado sobre trauma em todos os sistemas que lidam com crianças e adolescentes.

Panorama ampliado

O novo levantamento complementa o recente Estudo Australiano sobre Maus-Tratos Infantis, que apresentou pela primeira vez estimativas nacionais de abuso e negligência. Ao incluir outras formas de trauma, o trabalho amplia a compreensão sobre como experiências adversas moldam a saúde física e emocional ao longo da vida.

Fonte: G1