Um novo estudo feito por pesquisadores brasileiros identificou um número muito maior de variações da proteína HER2 do que se conhecia até hoje. O achado ajuda a entender por que alguns tumores de mama não respondem aos medicamentos mais modernos, mesmo quando têm indicação para esse tipo de terapia.
Pesquisadores do Hospital Sírio Libanês elevaram de 13 para 90 a lista de versões possíveis da HER2. A descoberta, publicada na revista Genome Research em 15 de julho, mostra que essas diferenças estruturais influenciam diretamente o modo como o tumor reage aos remédios.
A HER2 é uma proteína que participa do controle do crescimento celular. Em alguns tipos de câncer de mama, sua produção fica continuamente ativada, o que torna o tumor mais agressivo. Segundo os autores, cerca de 20% dos casos no Brasil apresentam esse comportamento.
Câncer de mama
O câncer de mama segue entre os mais incidentes no país e é a principal causa de morte por tumor entre as mulheres. O Inca estima 73 mil novos casos neste ano.
Tumores de mama podem apresentar níveis distintos da proteína. Os que têm expressão elevada são chamados de HER2 positivos e são candidatos às terapias alvo.
Outros com expressão baixa ou ausente, classificados como HER2 low ou HER2 zero, pertencem ao grupo HER2 negativo.
Quando indicado, o tratamento padrão combina quimioterapia com anticorpos que bloqueiam os sinais da proteína.
Como as variações afetam o tratamento
Os cientistas explicam que algumas das novas versões identificadas não possuem partes essenciais para que a HER2 se fixe na membrana celular ou se conecte aos anticorpos usados no tratamento. Para o pesquisador Pedro Galante, esse detalhe muda tudo.
“Ao chegarmos às 90 variações, vimos que algumas perdem regiões necessárias para a ligação com o anticorpo. Essa ligação precisa ser específica, como uma chave que só funciona na fechadura certa”, afirmou ele, em comunicado.
As análises mostraram que linhagens celulares com versões diferentes da proteína não reagiram aos medicamentos como o previsto. Os pesquisadores observaram que as células que produziam formatos alternativos de HER2 não responderam às drogas, enquanto aquelas com a versão convencional tiveram boa resposta.
“Isso reforçou nossa hipótese de que mudanças em regiões específicas do gene HER2 influenciam diretamente o efeito dos remédios”, esclarece.
O fenômeno está ligado ao splicing alternativo, processo natural que permite que um único gene dê origem a moléculas parecidas, porém distintas. Ele altera o RNA antes de ser usado na produção das proteínas. Mudanças nesse mecanismo já são associadas a várias doenças genéticas e a diferentes tipos de câncer.
Processo pouco explorado na prática clínica
Gabriela Der Agopian Guardia, primeira autora do estudo, se dedica ao tema há uma década. “Nesse trabalho conseguimos destacar um mecanismo que ainda recebe pouca atenção nas decisões clínicas, mas que tem impacto direto na resposta às terapias”, diz.
Para a especialista, compreender essas diferenças ajuda a pensar em formas de diagnóstico mais precisas e em medicamentos mais específicos.
O estudo reuniu 561 amostras de tumores de mama do The Cancer Genome Atlas, banco internacional de dados genômicos. A equipe analisou ainda células cultivadas em laboratório com respostas diferentes a drogas como o trastuzumabe e os anticorpos conjugados a fármacos, que levam quimioterapia diretamente às células doentes.
Os autores também usaram tecnologias de leitura genética que permitem observar detalhes invisíveis em avaliações tradicionais. Foi esse tipo de ferramenta que revelou o maior conjunto de versões do HER2 já registrado.
A equipe agora pretende ampliar as análises para outros tipos de câncer, como o de pulmão, onde o HER2 também pode ter papel importante. Outro objetivo é verificar se o padrão das versões da proteína interfere na resposta de pacientes que já receberam terapias anti HER2, especialmente os anticorpos conjugados a drogas.
Fonte: Metropoles
Foto: Reprodução

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